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domingo, 1 de outubro de 2023

Considerações ao católico que ensina e educa - parte I

 Palestra: II Congresso Imaculada Conceição – Apostolado Beato Padre Victor

Pensei em algumas forma de iniciar esta conferência cujo objeto é a educação desde uma perspectiva católica. Nesse sentido, cogitei inicialmente conceituar educação e tratar da pedagogia e suas dificuldades, mas nós católicos estamos hoje como que à deriva e como todo náufrago precisamos nos situar antes de proceder a qualquer ação, que no presente caso seria a própria ação pedagógica.

Partindo dessa constatação somos movidos a ir ao princípio de tudo para compreender o que se passa com a educação, como na ordenação das causas precisamos nos direcionar ao começo para nos inteirarmos da causa final. Pois bem, o evento histórico primordial marco não apenas para compreender a educação, mas tudo o que diz respeito ao ser humano é a Queda.

O homem fora criado de tal modo que as potências de sua alma estavam perfeitamente ordenadas. Com isso em Adão e consequentemente em Eva havia uma hierarquia em que a sensibilidade estava subordinada à vontade e esta ao intelecto. A sensibilidade, cabe aqui esclarecer, é a potência da alma vinculada às moções ou movimentos dos sentimentos e paixões. Poderíamos incluir aqui a inclinação a agir ou não agir em vista aos sentimentos provocados.

Já a vontade e a inteligência configurariam potências superiores da alma que o homem possui por ter sido criado à imagem e semelhança de Deus. A vontade é o que direciona e impele à ação voluntária, ou seja, sem uma (pré)determinação extrínseca. Já a inteligência ou racionalidade é a capacidade de apreensão da realidade gerando entendimento sobre a mesma. Originalmente essas potências estavam ordenadas de tal maneira que a sensibilidade se voltava ao belo, a vontade ao bem e o intelecto à verdade. Com a queda (pecado original) essa ordem foi desvirtuada. E nisto consiste o mal: em desejar um bem de forma desordenada em desconformidade ao seu fim.

A verdadeira educação não pode prescindir dessa realidade fundamental, a saber, de que o homem ferido pelo pecado só a muito custo consegue minimamente reaver tal ordem em que a inteligência é capaz de governar a vontade para o bem que lhe é próprio. Para alcançar tal intento o primeiro ponto[1] é estritamente religioso com o acesso aos sacramentos e por meio de uma vida de oração. Só que não se chega a esse ponto sem que se passe de algum modo pelo segundo ponto, a saber, a educação e aqui cabem algumas considerações.

A primeira é que o mundo moderno desde Descartes cindiu o homem ao meio e desde então dificultou-se ainda mais a compreensão de que fé e razão não se contradizem, mas se complementam com a primazia daquela sobre esta. Em segundo lugar, podemos também destacar que o termo educação adquiriu um caráter mais amplo envolvendo não apenas os conhecimento teóricos, mas também comportamentais, enquanto o termo ensino ficou restrito à aquisição de saberes técnicos e científicos.

A segunda consideração é que uma educação verdadeiramente católica não pode, senão metodologicamente e frente ao Estado, aceitar tais cisões modernas. Ela precisa passar pela questão fundamental sobre o fim do homem que leva à pergunta: o que é o homem? O ser humano é uma criatura divina composta de corpo e alma espiritual, como dissemos no início desta conferência, dotada de sensibilidade, vontade e inteligência. Com o pecado original sua natureza foi ferida e os dons preternaturais[2] perdidos. No que interessa mais propriamente à educação ocorre-lhe a perda da ciência infusa, ou seja, a capacidade do intelecto de conhecer de forma imediata. Desse modo, o estudo com afinco se torna conditio sine qua non para adquirir o conhecimento.

Como tudo que existe tende ao seu fim próprio, também o homem tende a um fim, a saber, a beatitude, a perfeita felicidade que consiste na visão de Deus em que repousa tanto seu intelecto quanto sua vontade. S. Tomás de Aquino aponta uma tendência do homem a buscar o que é necessário a tal fim como podemos observar no trecho abaixo da obra, “De Magistro” (Quaestiones Disputatae de Veritate): “os hábitos das virtudes antes da consumação delas, preexistem em nós em algumas inclinações naturais[...]”.



[1] Ele é primeiro na ordem espiritual, mas não em relação à ordem temporal.

[2] São eles: integridade, impassibilidade, imortalidade e ciência infusa.


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