Palestra: II Congresso Imaculada Conceição – Apostolado Beato Padre Victor
Pensei em algumas forma de
iniciar esta conferência cujo objeto é a educação desde uma perspectiva
católica. Nesse sentido, cogitei inicialmente conceituar educação e tratar da
pedagogia e suas dificuldades, mas nós católicos estamos hoje como que à deriva
e como todo náufrago precisamos nos situar antes de proceder a qualquer ação,
que no presente caso seria a própria ação pedagógica.
Partindo
dessa constatação somos movidos a ir ao princípio de tudo para compreender o
que se passa com a educação, como na ordenação das causas precisamos nos
direcionar ao começo para nos inteirarmos da causa final. Pois bem, o evento
histórico primordial marco não apenas para compreender a educação, mas tudo o
que diz respeito ao ser humano é a Queda.
O
homem fora criado de tal modo que as potências de sua alma estavam
perfeitamente ordenadas. Com isso em Adão e consequentemente em Eva havia uma
hierarquia em que a sensibilidade estava subordinada à vontade e esta ao
intelecto. A sensibilidade, cabe aqui esclarecer, é a potência da alma vinculada às moções ou movimentos dos
sentimentos e paixões. Poderíamos incluir aqui a inclinação a agir ou não agir
em vista aos sentimentos provocados.
Já
a vontade e a inteligência configurariam potências superiores da alma que o
homem possui por ter sido criado à imagem e semelhança de Deus. A vontade é o
que direciona e impele à ação voluntária, ou seja, sem uma (pré)determinação
extrínseca. Já a inteligência ou racionalidade é a capacidade de apreensão da
realidade gerando entendimento sobre a mesma. Originalmente essas potências
estavam ordenadas de tal maneira que a sensibilidade se voltava ao belo, a
vontade ao bem e o intelecto à verdade. Com a queda (pecado original) essa
ordem foi desvirtuada. E nisto consiste o mal: em desejar um bem de forma
desordenada em desconformidade ao seu fim.
A
verdadeira educação não pode prescindir dessa realidade fundamental, a saber,
de que o homem ferido pelo pecado só a muito custo consegue minimamente reaver
tal ordem em que a inteligência é capaz de governar a vontade para o bem que
lhe é próprio. Para alcançar tal intento o primeiro ponto[1] é estritamente religioso
com o acesso aos sacramentos e por meio de uma vida de oração. Só que não se
chega a esse ponto sem que se passe de algum modo pelo segundo ponto, a saber, a
educação e aqui cabem algumas considerações.
A
primeira é que o mundo moderno desde Descartes cindiu o homem ao meio e desde
então dificultou-se ainda mais a compreensão de que fé e razão não se
contradizem, mas se complementam com a primazia daquela sobre esta. Em segundo
lugar, podemos também destacar que o termo educação adquiriu um caráter mais
amplo envolvendo não apenas os conhecimento teóricos, mas também
comportamentais, enquanto o termo ensino ficou restrito à aquisição de saberes
técnicos e científicos.
A
segunda consideração é que uma educação verdadeiramente católica não pode,
senão metodologicamente e frente ao Estado, aceitar tais cisões modernas. Ela
precisa passar pela questão fundamental sobre o fim do homem que leva à
pergunta: o que é o homem? O ser humano é uma criatura divina composta de corpo
e alma espiritual, como dissemos no início desta conferência, dotada de
sensibilidade, vontade e inteligência. Com o pecado original sua natureza foi
ferida e os dons preternaturais[2] perdidos. No que interessa
mais propriamente à educação ocorre-lhe a perda da ciência infusa, ou seja, a
capacidade do intelecto de conhecer de forma imediata. Desse modo, o estudo com
afinco se torna conditio sine qua non para adquirir o
conhecimento.
Como
tudo que existe tende ao seu fim próprio, também o homem tende a um fim, a
saber, a beatitude, a perfeita felicidade que consiste na visão de Deus em que
repousa tanto seu intelecto quanto sua vontade. S. Tomás de Aquino aponta uma
tendência do homem a buscar o que é necessário a tal fim como podemos observar
no trecho abaixo da obra, “De Magistro” (Quaestiones
Disputatae de Veritate): “os hábitos das virtudes antes da consumação
delas, preexistem em nós em algumas inclinações naturais[...]”.
[1] Ele
é primeiro na ordem espiritual, mas não em relação à ordem temporal.
[2]
São eles: integridade, impassibilidade, imortalidade e ciência infusa.
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