Versão Mandeville: "Vícios privados, benefícios públicos"
Versão política brasileira: "Vícios públicos, benefícios privados"
Em busca de sabedoria em tempos de relativismo professo. Talvez um pouco de classicismo seja necessário, um retorno aos paradigmas perdidos... Procuro dessa forma momentos de lucidez para além de razões e desrazões extremadas. Neste blog coloco à vossa disposição textos de minha autoria nos quais como católico apostólico romano busco alcançar sabedoria verdadeira. Com a graça de Deus poderei combater o bom combate contra a mentira que reina quase absoluta hodiernamente. ¡VIVA CRISTO REY!
Versão Mandeville: "Vícios privados, benefícios públicos"
Versão política brasileira: "Vícios públicos, benefícios privados"
A história da Igreja nos regala com um grande número de conversões
grandiosas como a do escritor inglês G. K. Chesterton, para citar um nome
relativamente próximo de nós historicamente. Tais conversões são preciosas em
vários sentidos e nos mostram a efetivação da parábola do Bom Pastor. Quando se
fala de grandes conversões um nome que vem à mente de muitas pessoas é o de
Santo Agostinho de Hipona, conversão esta fruto das incansáveis orações de sua
mãe S. Mônica.
Agostinho fora um jovem errante e sua conversão se deu aproximadamente
aos 33 anos após grande inquietação que o levou do neoplatonismo ao
maniqueísmo. Sua história de conversão é extremamente interessante, mas não
será o objeto deste texto. Aos interessados aguardem novos textos e acompanhem
o segundo módulo do curso de Introdução à Filosofia Cristã que será divulgado
nos meios eletrônicos.
O objetivo aqui é compreender alguns elementos da filosofia e teologia
do bispo de Hipona. Nesse intento iremos recorrer à pintura em óleo sobre tela
do pintor Philippe de Champaigne, um dos mais talentosos artistas do século
XVII que passou a se dedicar a obras sacras após a cura milagrosa de sua filha
e que nos brindou com um belo retrato de S. Agostinho, apesar de suas
inclinações ao jansenismo.
A ideia aqui é partindo da contemplação da obra oferecer uns poucos
elementos interpretativos da filosofia cristã em geral e da agostiniana em
particular. Primeiramente gostaria de destacar que a pretensão aqui é singela
tanto no aspecto de análise estética, não sou crítico de arte, quanto no âmbito
filosófico e teológico. Feitas essas exposições iniciais podemos começar nossas
considerações.
O ser humano é dotado de sensibilidade, vontade e inteligência,
voltadas respectivamente ao belo, ao Bem e à Verdade. Com a perda dos dons
preternaturais, oriunda do pecado original, tal ordem foi desvirtuada e a
sensibilidade se voltou ao feio, ao desproporcional, enquanto a vontade e a
inteligência se voltaram ao mal e à mentira, respectivamente. Para que tal
desordem se desfaça é preciso que o ser humano busque auxílio na graça divina.
E ao busca-la ele perceberá que Deus habita a sua própria alma, chegando o
santo a expressar: “Deus nos é mais íntimo, que o nosso próprio íntimo”
(Confissões III, 6, 11; 53,10).
Observando a pintura de Philippe de Champaigne podemos analisar tal
reordenamento da sensibilidade para a vontade e da vontade subordinada à
inteligência da seguinte forma: A verdade representada pelo Sol (acima), em que podemos
ver escrito em latim “veritas”, que é próprio Cristo, a luz do mundo, ilumina a
“cabeça”, ou seja, a inteligência e abrasa o coração (abaixo) que representa a vontade
que coberta pela chama ardente da Verdade leva o homem ao Bem, ao reto caminho.
Dessa forma, por intermédio da graça divina o ser humano é capaz de
encontrar-se a si próprio encontrando a Verdade mesma que habita a profundidade
de seu íntimo. Cabe aqui mencionar também que a vontade é o terreno do
livre-arbítrio que se estiver ordenado à Verdade possibilita ao homem ser
livre, sendo por sua vez a liberdade vinculada ao Bem. Só se é verdadeiramente
livre quando se conhece a Verdade e se orienta por ela e, em última instância,
a Verdade é o próprio Cristo como também o é o Bem.
Outro ponto que gostaria de destacar na pintura é em relação ao que se
encontra sob os pés do santo. Trata-se de livros do monge Pelágio e
provavelmente de Juliano de Eclano, ambos adeptos da heresia pelagiana. Tal
detalhe torna a pintura ainda mais instigante e recomendável, afinal não bastou
ao santo encontrar a verdade, mas lhe coube combater o erro e a mentira, pois a
luz da verdade é como a lâmpada mencionada por Nosso Senhor: ela deve ser posta
à vista, bem como as trevas devem ser dissipadas.
Como foi dito no início, este texto têm poucas pretensões, pois nossa
expectativa é desenvolver mais detalhadamente o assunto no curso de Introdução
à Filosofia Cristã oferecido por mim junto à Associação Cultural São Filipe
Néri. Informações sobre inscrições e mais informações serão divulgadas oportunamente.
Que Maria Santíssima interceda a Deus por nós!
A educação moderna e consequentemente contemporânea ao desprezar a contemplação retira da educação a capacidade de proporcionar ao educando ascender às mais elevadas potências humanas confinando-o num pragmatismo animalesco.
Em minha adolescência, principalmente quando estava no Ensino Médio, encantei-me com os belos ideais socialistas de uma sociedade sem desigualdades. Para consolidar essa visão contribuíram sobremaneira alguns professores e a TdL (teologia da libertação) que era e continua sendo muito influente na Arquidiocese de Belo Horizonte onde nasci e fui criado. Quando cheguei à universidade ainda adolescente, o encantamento foi ainda maior, o que culminou com minha participação do Diretório Acadêmico (DA) na universidade como diretor de políticas estudantis. Com esse cargo tive uma experiência que foi essencial para uma série de mudanças em minha vida e que me trouxe à época uma enorme desilusão. Compartilharei convosco tal história:
Após uma reunião onde
acertávamos os detalhes de um congresso de estudantes, eu num arroubo de
inocência questionei junto ao principal organizador se não deveríamos convidar
a juventude do PSDB para tornar os debates mais democráticos e diversificados
me dispondo eu mesmo a confrontá-los se preciso. Num tom que me soou como o de
um deboche o rapaz, já não tão jovem, disse que “com esse povo a gente não debate,
a gente só bate”. Já se vão quase 15 anos e essa frase continua viva em minha
memória, afinal abalava as minhas convicções de que num debate político as
vozes discordantes deveriam ser ouvidas, além de ter sido um verdadeiro soco na
boca do meu estômago idealista e ingênuo.
A partir dali comecei a me afastar pouco a pouco de tais movimentos e a questionar profundamente as minhas posições políticas, o que me levou a uma reorientação dos meus valores e princípios. E é a partir dessa experiência de vida que gostaria de analisar um polêmico fenômeno contemporâneo: o cancelamento.
Tal fenômeno tem sido tão
comum e intenso que gerou o termo “cultura do cancelamento”, que consiste em
linhas gerais numa tentativa de apagar as referências, a história, a fama e as
fontes de financiamento de uma pessoa, associação ou empresa que tenham em
algum momento mencionado ou feito algo que de alguma forma pudesse ferir ou
contradizer valores considerados intocáveis para um grupo de agentes virtuais
que avaliam ações dos “cancelados” conforme seus padrões morais e éticos
promovendo uma campanha de anulação não apenas dos atos tidos como racistas,
homofóbicos, machistas, etc., mas das pessoas que supostamente os teriam
praticado.
Observando esse modus operandi de jovens ativistas ou
justiceiros sociais contemporâneos não os posso dissociar do que vivi há quatorze
anos e do que o movimento revolucionário progressista vem fazendo há no mínimo
dois séculos. O que está por trás do cancelamento é a mesma prática da anulação
do verdadeiro diálogo e do contraditório, não há debates ou chance para defesa,
nem sequer se trata de um boicote, já que este se configura por uma campanha de
recusa a uma ação de um indivíduo ou grupo e não a recusa à existência mesma do
indivíduo ou grupo como no caso do cancelamento. O que se pretende, em última
instância, é a anulação ou extermínio do desafeto.
E não nos enganemos, esse é
um fenômeno teleguiado, não é uma iniciativa espaçada de jovens contrariados e
mimados incapazes de utilizar os mecanismos civilizados para confrontar quem em
tese “mereceria ser cancelado”. Esse tipo de ação dirige-se na maior parte das
vezes a quem pronuncia algo tido como “conservador” ou em oposição às pautas
progressistas. E não deixa de ser irônico que grupos abertamente críticos à
moralidade clássica se mostrem tão moralistas e intransigentes, afinal “é
proibido proibir, mas uma proibiçãozinha de vez em quando não faz mal a
ninguém”. Então tal qual o “líder estudantil” que eu havia citado preferem
negar a existência do diferente do que lidar com eles no âmbito público das
ideias.
Se formos analisar mais de
perto o modo como se faz o processo do cancelamento observamos que em quase
tudo se assemelha a um tribunal retirando-se “apenas” a defesa. Há somente
acusação e condenação sucedida por linchamento moral que substitui a execução
penal.
O resultado perceptível
desse moralismo que se constitui em tribunal da história é de um lado a
tentativa de “purificar a história” anulando personagens históricos que
deixaram um escrito ou obra tida como desagradável e de outro a reconstrução do
passado como se isso fosse ontologicamente possível. Distinguindo aqui a massa
de manobra das cabeças pensantes vemos que os primeiros não enxergam o absurdo
do que promovem enquanto os últimos apostam na ignorância dos primeiros para acumularem
cada vez mais poder, pois quem “Quem domina o passado domina o futuro; Quem
domina o presente domina o passado” como indicou Orwell no livro “1984”. Sobra
então, literalmente, para figuras históricas tão diversas como Cristóvão
Colombo e David Hume serem apagados ao invés de serem estudados.