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sábado, 29 de outubro de 2011

Visões de mundo e ação: resposta a uma amiga

Conversando outro dia com uma amiga começamos a falar de filosofia, assunto do qual dificilmente eu escapo, e ela me disse algumas coisas que fazem parte do modo como ela vê o mundo, mas que não é isolada, pois é eco de uma compreensão mais ampla defendida por muitas outras pessoas. Tratávamos de religião e moral e ela manifestou descrédito quanto às instituições, mas não em relação às crenças pessoais de cada crente. Daí para dizer que cada um pensa de um jeito e tem uma ideia diferente e temos que respeitar suas posições foi um pulo, quase um salto de seis pra meia dúzia. Na hora balbuciei uma reação nada convincente, mas que deveria ter a seguinte estrutura: essa ideia é insustentável. Se deixei a desejar naquele momento pretendo ser mais claro neste texto. Então vamos então aos motivos.
Cada ideia, pensamento e principalmente crença tem uma prática subjacente, inclusive as ideias científicas, que geram reações de entendimento ou não, de estupefação ou indiferença, etc. Sabendo disso verificamos que concepções de mundo diferentes geram hábitos e ações diversas, não poucas vezes contrárias e conflituosas umas com as outras. Em muitos casos, que o diga a diplomacia brasileira, não tomar posição é justamente tomar a pior posição possível devido à omissão o típico “ficar em cima do muro”. Logo a opinião de que toda opinião tem o mesmo valor, não deixa de ser opinião (cf. http://linobatista.blogspot.com/2011/05/impossibilidade-logica-do.html) e enquanto tal autoafirmativa. Portanto dizer que não existem verdades absolutas já é dizer uma verdade absoluta, então do ponto de vista lógico a posição de minha amiga é insustentável e aqui cito Aristóteles: “[...] porque, embora nos sejam caros, a piedade exige que honremos a verdade acima de nossos amigos.” (Ética a Nicômaco. 1096a). E olhe que Aristóteles foi o grande discípulo de Platão.
 
É uma questão que merece outra postagem...
Cont.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

O poder do marketing


Costumo dizer que os publicitários brasileiros são muito criativos e muitas vezes é mais interessante assistir às propagandas do que aos próprios programas. Mas nem sempre toda essa criatividade manifesta ideais nobres voltando-se somente a apologia de um consumismo sem limites e sem escrúpulos. A competição nem sempre é leal e o poder de persuasão exercido por argumentos fortes pode trazer prejuízos a pessoas que não conseguem discernir o que é útil e proveitoso do que não é.
Sendo mais pontual decidi fazer uma análise comparativa entre dois comerciais promovidos por empresas do ramo automobilístico. O primeiro é a de um cachorro simpático que começa a falar por estar no carro, que possibilitou que ele tivesse um assunto pra falar (http://www.youtube.com/watch?v=fG07zf5ONRQ&feature=related). O outro é a de um homem sem gasolina que consegue carona num carro bonito e potente e percebe que ele é bem melhor do que o carro que ele tem. Ao voltar ele simplesmente utiliza a gasolina para explodir o seu carro (http://www.youtube.com/watch?v=1Pqt-YEYpS4). Mais do que analisar tecnicamente as propagandas, por exemplo, a posição de câmeras, a linguagem, fotografia, sonoplastia, etc. a ideia é analisar as concepções mercadológicas por detrás do próprio comercial. O sentimento de desdém com carros que não sejam o da marca visada na segunda propaganda é gritante. Numa época na qual se valoriza o consumo exacerbado, comerciais desse tipo figuram como sintomas e proliferadores de uma visão de mundo especifica: a mercadológica. O primeiro comercial apesar de também ter forte apelo não é tão violento, pelo contrário é bem sutil. Este demonstra sagacidade e auto valorização, aquele demonstra a que ponto chegamos quando o assunto é consumo e venda de produtos.
Ponderar as estratégias de marketing nos permite tanto verificar o que correntemente se propõe como valor, tomando aqui o sentido mais amplo do termo valor, como também permite analisar o que se projeta como valor no futuro. Reproduz como no segundo exemplo a ideia de que vale a pena prescindir do que conquistamos para adquirir novidades não importa com que radicalidade. Não está em jogo somente um carro que seja ou não descartável, pois inclusive nossas relações afetivas também se tornam descartáveis, se alguém me desagrada eu descarto essa pessoa da minha vida, mas em contrapartida eu não vejo que também eu posso ser a pessoas que desagrada alguém. O marketing não pode ser pensado despretensiosamente mesmo porque ele não está isolado do mundo, mas é por ele criado e nele se constrói.
Continua... 

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Sobre Razão e Fé


A questão que proponho é a seguinte: a “razão abrange toda a atividade espiritual do ser humano”? Há que se distinguir aqui o termo abrange: se ele é analítico, ou seja, se a razão analisa toda a atividade espiritual do ser humano, inclusive ela própria, ou se ele é constitutivo, logo, se a razão encerra nela mesma toda a dimensão espiritual do homem. No primeiro sentido a razão enquanto atividade da inteligência estaria corretamente situada já que a sinergia do Espírito (inteligência e vontade) estaria mantida. O segundo sentido, caso seja o próprio, estaria equivocado, pois a Inteligênica (razão) não estrutura a Vontade, ou melhor, a Vontade não emerge da razão[1], mas juntamente à Inteligência compõe o Espírito.
Outra questão, surge de uma possível confusão que pode causar a benção introdutória da encíclica “Fides et Ratio” do papa João Paulo II. Ela coloca numa metáfora fé e razão como “duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade”. Entretanto sabemos pela Tradição e pelas filosofia e teologia cristãs católicas que a fé tem a primazia e complementa a insuficiência da nossa razão. Pela metáfora das asas parecem que ambas contribuem de igual maneira para se alcançar a Verdade que é o próprio Cristo: “Jesus lhe respondeu: Eu sou o caminho, a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim.” Jo 14,6.
Chegamos então ao seguinte quadro: a fé ilumina, a inteligência acolhe e a vontade impulsiona. A fé (credo) se caracteriza segundo o “Catecismo Romano” do Concílio Tridentino da seguinte forma:

“Neste lugar, a palavra ‘Creio’ não tem a significação de ‘pensar’, ‘dar opinião’. [...] Crer é ter uma profunda convicção em seu íntimo. As verdades de fé devem ser aceitas com firmeza pela inteligência.” p. 90. (Edição Brasileira, Ed. Vozes, 1951.).

Lino Batista
Obs.: Esse texto surge de discussões realizadas num curso que estou fazendo e versa sobre a “racionalidade da fé”.


[1] Razão = manifestação da Inteligência.