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quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Tentáculos do Estado


O jornal Estado de Minas publicou em seu jornal impresso no dia 25 de fevereiro de 2013, Caderno Gerais, a seguinte reportagem: “Solidária, Lucrativa e Ilegal”. Em resumo, a matéria trata das “caronas” intermunicipais (pagas) combinadas via Internet. O jornalista Tiago de Holanda, que assina a reportagem, menciona o baixo preço da “passagem” dessas caronas e destaca a funcionalidade e eficiência desse sistema organizado pela rede de computadores. Entretanto, como enfatizou o diretor do DRE (Departamento de Estradas de Rodagem) João Afonso Baeta Costa, a prática é ilegal cabendo, portanto, as medidas legais de punição para quem for pego em delito.
Não vou discutir aqui a dimensão jurídica do fato e da lei, mas pensar em “voz alta” sobre a razoabilidade e praticidade de tais caronas. Evidentemente a lei se justifica, afinal em caso de acidentes o ônus pode ficar em certa medida com o Estado que arca com o pagamento de indenizações do seguro obrigatório[1]. Em outra linha de pensamento, mais utilitarista, fica a questão do imposto e dos prejuízos que podem sofrer o transporte coletivo legalmente concedido. Não podemos esquecer estas dimensões, mas é preciso pensar mais profundamente sobre o assunto discutindo sobre a razoabilidade da lei e mais do que isso, questionar a aplicabilidade da sua fiscalização.
Primeiramente ao se analisar qualquer lei, e as de concessões estatais para transporte público não são exceções, deve-se ter em mente o seu objetivo e qual princípio visa defender, afinal nenhuma lei é fim em si mesma. Seguindo esta análise e observando o caso das caronas vejo que os princípios de segurança e ordem pública estão sendo mantidos, ou seja, esse sistema de caronas não afeta diretamente a segurança e a ordem, caso os proprietários dos veículos estejam em dia com a manutenção dos mesmos e respeitem as leis básicas do trânsito. Logo, de acordo com este raciocínio escapamos de um legalismo vazio afirmando que os objetivos aos quais a própria lei serve estão sendo preservados.
Outro ponto do problema é que a fiscalização nesse caso pode ser bastante ineficaz na medida em que muitas dessas caronas combinadas são efetuadas por amigos que se conhecem e não vão apresentar queixas sobre o transporte. No caso de serem pegos em alguma blitz os ocupantes do veículo podem alegar que estão viajando juntos porque são amigos e o agente ou quem quer que seja não pode verificar isso do ponto de vista afetivo, afinal cada um é amigo de quem quiser. Sobra para o DER então fiscalizar a Internet, mas também aí em alguns casos vão ter que conseguir mandatos judiciais para conseguirem acessos, por exemplo, a grupos particulares protegidos pelo sigilo de informações pessoais, o que seria complicado, pois como sabemos nossa justiça é lenta.
Finalizando a reflexão que propus cabe dizer que a tentativa de extinguir as caronas pagas ou não é uma ação extremamente autoritária e contrária à liberdade de sujeitos, adultos e autônomos que têm o direito de saberem o que é melhor para eles mesmos em relação a como vão se locomover. Nossos representantes nas várias esferas do Estado têm que entender que os cidadãos não são crianças que devem ser protegidas a todo instante, o Estado não é onisciente e onipotente, nem tudo está na sua alçada. As pessoas devem ser livres e conscientes de seus atos e se esses forem contrários a lei responde-los, mas o problema fica muito sério quando algumas leis são utilizadas justamente para negar isso aos cidadãos.



[1] É bom lembrar que tal seguro é um imposto como o IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores), ou seja, todos os proprietários de veículos devem pagar pelo seguro.


sábado, 23 de fevereiro de 2013

Viva a democracia?!


Caros leitores acabei de ler a seguinte notícia: Cardeal Dom Odilo Pedro Scherer é hostilizado na PUC-SP. Não tenho palavras para descrever tamanho absurdo. Como alunos de uma universidade católica são capazes de destratar um bispo dentro de uma instituição diretamente vinculada à arquidiocese? Como chegamos a este ponto?
Amigos estes são os frutos da democracia liberal, alguns podem dizer que na verdade o mau uso do direito a se manifestar foi o que produziu este ato de barbárie, mas não, o mau uso de um instrumento qualquer se dá de maneira isolada, e esse não foi um caso isolado. O número de atos e manifestações que exemplificam o quero dizer só estão aumentando, vejam por exemplo a recepção da jornalista cubana Yoani Sanchez (aqui, aqui e aqui) [1]. Os maiores defensores da democracia liberal são os primeiros a trai-la, são os que pedem direito a elevar sua voz calando as vozes dos outros, ou seja, a democracia é o direito de alguns, os “revolucionários” (sic). Ó como são democráticos!
Voltando ao caso da PUC-SP temos o fruto bem acabado e crescido da libertinagem que tem sido cultivada inclusive nos meios católicos endossados pelo discurso e pela prática de boa parte do clero pós Concílio Vaticano II. Pois bem criaram os monstros agora lidem com eles. Infelizmente não há como pedir aos manifestantes que tenham coerência e saiam da universidade católica, caso não concordem com as leis da Igreja, afinal para os revolucionários de plantão também os prédios das instituições religiosas devem ser expropriados por um Estado centralizador e paradoxalmente democrático.
Continua...




[1] A crítica que faço aos revolucionários que pedem cabeças ao melhor estilo Revolução Francesa não significa a adesão às posições defendidas por Yoani Sanchez, só utilizei este caso para mostrar a incoerência os revolucionários.


terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

O reinado da doxa


O filósofo grego Platão, um dos maiores pensadores que já existiu, afirmou que é impossível se fazer ciência a partir da opinião (doxa), pois o conhecimento verdadeiro só é possível com a contemplação das ideias perfeitas, eternas e imutáveis existentes no “mundo inteligível”. Pode-se como fez Aristóteles, seu grande discípulo, criticar outros aspectos do pensamento platônico acerca inclusive do “mundo sensível”, entretanto, dificilmente questiona-se sem erro o fato de que a doxa não pode ser fundamento máximo da ciência e do conhecimento. Por outro lado isso não significa que ela não tenha importância alguma, e que um conhecimento verdadeiro pode surgir de uma opinião que se mostrou correta.
Queria com estas palavras demonstrar que por mais que a opinião seja útil ela não pode ter a última palavra em assuntos que demandem reflexões relevantes e sérias. De forma anedótica podemos dizer que a opinião serve para a pessoa escolher se gosta ou não de comer goiabas, mas não para afirmar sem mais se um terreno serve ou não para plantar goiabeiras, para isso é necessário um conhecimento mínimo de agronomia. Apesar disso parecer claro, a “civilização tecnológica” possuidora de vasto arsenal científico, dá cada vez mais espaço para a opinião ou achismo em assunto de extrema relevância. Convivem juntos um rigorismo tecnicista e um subjetivismo niilista! [1]
Este parece ser o cenário atual herdeiro do antropocentrismo e do relativismo. Se a ciência e a técnica tomaram para si toda a razão, sobrou para o “resto” desrazão. Então o que impera em política e religião, por exemplo, quando não os reduzem à ciência tecnicista, é o achismo. Isso gera fenômenos impressionantes. No caso da política lembro que minha mãe diz criticando a democracia liberal que alguns parentes nossos votaram no Fernando Collor à época porque ela “boa pinta”, elegante, etc. No caso da religião cito um caso recente o da renúncia do Santo Padre, o Papa Bento XVI. Nem bem ele havia se pronunciado e irromperam milhares de analistas dando suas opiniões, algumas delas tão descabidas que chegam a ser cômicas.
Caros amigos é por essas e outras que ando meio desconfiado quando ouço perguntas do tipo: O que você acha disso? Qual a sua opinião sobre aquilo?



[1] Isso me faz lembrar a seguinte passagem bíblica: “Guias cegos! Filtrais um mosquito e engolis um camelo.” (São Mateus 23,24). Cabe explicar que menciono esta passagem apenas de forma analógica. 


segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Lei seca e a roupa nova do rei: servilismo dos eclesiásticos?



Não são raros na história da Igreja os casos de intromissões e ataques à Igreja por parte do poder temporal, como no caso da Revolução Francesa que “premiou” os religiosos mais fiéis com a guilhotina. A palavra chave aqui é fidelidade, pois houve aqueles que por medo e comodidade traíram a Igreja e abraçaram o mundo, escolhendo para eles a porta larga e infelizmente levando muitos por esse caminho. São esses os que Jesus afirmou serem lobos em pele de cordeiros:

Entrai pela porta estreita, porque larga é a porta e espaçoso o caminho que conduzem à perdição e numerosos são os que por aí entram. Estreita, porém, é a porta e apertado o caminho da vida e raros são os que o encontram. Guardai-vos dos falsos profetas. Eles vêm a vós disfarçados de ovelhas, mas por dentro são lobos arrebatadores. (São Mateus 7,13-15)

A brevíssima rememoração feita acima nos serve de exemplo, assim como muitos outros casos, no que concerne às tentações que a Igreja Militante padece. A questão então é: Qual a verdadeira atitude cristã frente aos desafios do mundo? Ou também: Hodiernamente como o clero deve agir afinal a secularização dia a dia é levada a cabo? A resposta para as duas questões é; cabe a todos cristão em momentos de dificuldades agir com coragem. Coragem para enfrentar o mundo e afirmar no fim assim como São Paulo: “Combati o bom combate, terminei a minha carreira, guardei a fé.” (II Timóteo 4,7)
Na postagem anterior fiz uma comparação entre o conto, “A roupa nova do rei”, e a lei seca, estendo-a a todas a todas as leis e medidas de igual teor ideológico. Associando o que disse no texto anterior com o que afirmei até aqui gostaria de lembrar dois fatos sucedidos no Brasil nos quais duas autoridades católicas deram mostras de virtude cristã. O primeiro se passou na Arquidiocese de Olinda e Recife onde simplesmente fazendo cumprir o que manda a lei da Igreja o então arcebispo Dom José Cardoso Sobrinho apenas promulgou excomunhões automáticas (latae sententiae) a quem havia promovido o aborto de duas crianças (sobre a repercussão do caso clique  aqui e aqui). O segundo se passou na diocese de Guarulhos onde o então bispo Dom Luiz G. Bergonzini cumprindo seu dever de pastor alertou suas ovelhas sobre os perigos de votar em certos candidatos (conferir aqui e aqui).
O que há em comum entre os casos acima citados além do restrito cumprimento do dever das autoridades eclesiásticas diretamente envolvidas? Infelizmente ambos sofreram duras críticas não apenas dos inimigos declarados da Igreja, o que seria de se esperar, mas também, o que mais nos deveria entristecer, receberam críticas de seus pares ou simplesmente sofreram com o silêncio da omissão ou quando muito alguns nem um pouco animadores “tapinhas nas costas”. Onde estavam os paladinos da moralidade pública que infestam as pastorais da CNBB? Ou onde estavam os defensores das “liberdades democráticas” presentes nas dezenas de universidades católicas espalhadas pelo Brasil? Pouquíssimos deram suas “caras a tapa”, por isso, tais perguntas permanecem exigindo respostas urgentes que clamam manifestações públicas.
Parece-me que mais uma situação próxima das que citei apresenta-se para a Igreja no Brasil hoje com o endurecimento da lei seca e sua “tolerância zero”, pois esta pode prejudicar a celebração do Sacramento central da Igreja, a saber, a Eucaristia em algumas paróquias. É uma lástima, no que sei até o momento, que nenhuma autoridade eclesiástica tenha tido a coragem de apontar publicamente a “nudez do rei”, o que pode ser um tiro no pé, afinal muitos padres precisam se locomover de carro após a missa para atenderem mais igrejas, sendo que eles podem casualmente serem flagrados e autuados por dirigirem embriagados (sic). No entanto, até agora só vimos manifestações “politicamente corretas” (aqui) de bispos que tentam adequar a lei da Igreja e de Cristo às leis do mundo e nos fazem lembrar da passagem em que São Pedro tentou dissuadir Cristo do sofrimento[1]. Poderíamos então levantar mais uma questão: a quem realmente servimos, a Deus ou ao mundo?
Não pretendo aqui, pecador que sou, julgar e condenar homens consagrados por Deus, nem sou hipócrita para afirmar que não sou também tentado a me acomodar, mas, por outro lado Cristo disse que conhece a árvore pelos frutos[2] e mesmo sendo leigo não sou insensato em afirmar que os frutos do servilismo ao Estado moderno por parte do clero não são podres, relembro o caso da Revolução Francesa. Por isso, como leigo gostaria de respeitosamente perguntar aos bispos brasileiros: vale a pena sacrificar nossas tradições litúrgicas para evitar conflitos com um Estado que mostra cada dia mais centralizador e ateu?
Alguns poderiam dizer que não há mais como voltar atrás e que a secularização é um movimento sem volta, mas não acredito nisso. S. Pedro que recebeu do próprio Cristo as chaves do céu, anteriormente o havia negado, mas voltou atrás e sinceramente se arrependeu e como nos disse Chesterton: “São Pedro negou seu Senhor; mas, pelo menos, nunca negou que O tenha negado”. Está é a coragem católica, esta é a virtude cristã. Como fiel peço a Deus que nossos pastores tenham a humildade e a coragem petrina, para que com atitudes de servidão a Deus e abnegação das leis do mundo sirvam de exemplo para mim e muitos outros que vacilam na fé.
Que os nossos eclesiásticos gritem ao rei do mundo com a pureza de crianças e o julgamento de homens[3]: “Você está nu” e rompam com os grilhões da escravidão do pecado. É isso que peço a Deus com fervor para os nossos legítimos pastores.

Referências bíblicas: http://www.bibliacatolica.com.br


 




[1] 21. Desde então, Jesus começou a manifestar a seus discípulos que precisava ir a Jerusalém e sofrer muito da parte dos anciãos, dos príncipes dos sacerdotes e dos escribas; seria morto e ressuscitaria ao terceiro dia.
22. Pedro então começou a interpelá-lo e protestar nestes termos: Que Deus não permita isto, Senhor! Isto não te acontecerá!
23. Mas Jesus, voltando-se para ele, disse-lhe: Afasta-te, Satanás! Tu és para mim um escândalo; teus pensamentos não são de Deus, mas dos homens! (São Mateus 16,21-23)

[2] Toda árvore boa dá bons frutos; toda árvore má dá maus frutos. (São Mateus 7, 17)

[3] Irmãos, não sejais crianças quanto ao modo de julgar: na malícia, sim, sede crianças; mas quanto ao julgamento, sede homens. (I Coríntios 14,20)



quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Lei seca e a roupa nova do rei



O conto universalmente conhecido de Hans Christian Andersen (aqui) é paradigmático. De forma aparentemente despretensiosa, para alguns, ele nos possibilita diversas reflexões sobre poder, honestidade, ignorância, etc. Mas o que há em comum entre o conto e a lei seca? Respondo: Muita coisa! O conto demonstra que a autoridade mal administrada gera um reino de medo e ignorância, afinal o medo de que o rei fosse contrariado ou desagradado, fez com que os seus funcionários e súditos fingissem ver o que não viam. Em nome da inteligência e porque não prudência recaíram numa obediência cega.
A lei seca é como a roupa nova do rei na medida em que os representantes do Estado, reis sem coroa e realeza, por mero capricho ou incompetência impingem à população uma lei arbitrária, pois contradiz as experiências evidentes da maioria da população[1] que conhecem pessoas sensatas que são capazes de beber certa quantidade de bebida alcoólica sem provocar acidentes. Certamente eles têm a favor a ciência, mas que ciência, a mesma que tinham os soviéticos ao invadir a Ucrânia, a mesma que tinham os “médicos” nazistas ou a que têm os que fabricam armas de destruição em massa?
Pois então ciência sem razoabilidade não justifica nenhuma ação, pois mais nobre que ela possa parecer a alguns desavisados, que precisam de uma resposta efetiva para os males dos acidentes de trânsito, mas que de maneira alguma compactuam com os princípios autoritários que fundamentam muito do que vem sendo feito politicamente no Brasil.
O que está acontecendo no Brasil é que na incapacidade de fazer o que lhes cabem, por exemplo, punir quem excede os limites e cumprir de fato as leis (que são razoáveis), os representantes estatais estão optando por um legalismo infrutífero  e invasivo, elaborando medidas que objetivam controlar os cidadãos dizendo o que é melhor para eles. Ao invés de possibilitar que a cultura se desenvolva naturalmente, o Estado paizão quer que seus cidadãos sejam eternas crianças, incapazes de escolherem aquilo que é bom para eles próprios.
Acontece que, como no caso do conto já citado, é a inocência de uma criança que quebra a hipocrisia e o fingimento, é a franqueza juvenil que grita: “O rei está nu!”. Se não cabe às crianças gritarem perante os desmandos estatais, cabe a nós adultos imitarmos suas virtudes e dizermos com franqueza que o Estado está nu e quer que nós vejamos crimes inexistentes e fechemos os olhos frentes às suas arbitrariedades. A aplicação da lei seca não é um fato isolado, mas demonstra que os “reis e gurus” de nossa pátria não têm pudor de transformar ideias nobres em medidas totalitárias mascaradas, cheias de bom mocismo.


Continua.
Próximo: Lei seca e a roupa do rei: servilismo dos eclesiásticos?


[1] O argumento neste ponto não é quantitativo do tipo: a maioria quer, então que seja. A ideia é demonstrar que os fatos podem ser comprovados por uma simples observação, o que qualquer um no pleno uso de sua razão pode fazer.