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quarta-feira, 3 de abril de 2024

Espírito acusatório

Todo ano na quaresma escuto algumas falas que acredito também sejam ouvidas pelo meu leitor que busca viver esse tempo em conformidade com o que manda a Santa Igreja. Trata-se de expressões como: “Do que adianta não comer carne e ficar fazendo coisa errada” ou “a pessoa bebe o ano todo, mas acha que parar na quaresma vai adiantar alguma coisa”. Certamente há nelas um fundo de verdade, mas o que elas expressam é antes um espírito acusatório do que um espírito admoestativo, uma censura ao bom comportamento com a aparência de uma crítica a uma suposta hipocrisia. O propósito deste texto é justamente mostrar a malícia que há nesse modo de proceder que não deve amedrontar ou desanimar a quem que, com o coração sinceramente contrito, queira viver uma santa e piedosa quaresma.

Lembro-me que certa vez em que eu, recém saído da adolescência, fiz a abstinência de carne na Quinta-feira Santa. Pois bem, nesse dia como em muitos outros, saí para almoçar com alguns colegas da empresa em que eu estagiava para comer num restaurante especializado em carnes. Qual não foi a surpresa deles quando pedi um omelete. Alguns manifestando uma surpresa autêntica, alguns dando de ombros e outros ainda ironizando e dizendo que Deus não havia pedido esse tipo de atitude. Fiquei firme em minha resolução e comi um ovo frito, pois não estavam servindo omelete.


Não conto essa história para me gabar, afinal o fazia mais por tradição e resolução fraca do que pela compreensão de partilha com o Sagrado Sacrifício de Nosso Senhor, mas ainda assim lucrava os benefícios espirituais da prática. O que quero na verdade é mostrar uma prática comum que as falas reproduzidas no início do texto representam e que chamo de “espírito acusatório”. Esse “espírito” é que motivava o alerta de Nosso Senhor no evangelho de S. Mateus capítulo 23, versículo 13, em que Ele repreendia os fariseus que não entravam e não deixavam os outros entrarem. Observe o meu leitor que geralmente quem faz essas críticas aos católicos não fazem eles mesmos nenhum tipo de sacrifício ou vivem a religião. Repetem as atitudes dos fariseus quando acusam os outros de farisaísmo.

  

Mas isso não é uma atitude isolada ou fortuita, afinal vivemos num mundo e numa era hostil,onde as práticas cristãs são apontadas como sinais de hipocrisia. Por vezes a hostilidade é clara e virulenta, mas muitas vezes ela aparece sutilmente. Neste caso, o acusador tece elogios aos valores que se julgam cristãos, mas têm ojeriza à sua prática real, talvez porque tais práticas exponham sua tibieza. Entretanto, fato é que pesa, aos olhos do mundo, ao católico convicto a fama de falso moralista quando tal definição caberia melhor aos acusadores que imitam o primeiro acusador.


Quaresma de 2024


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