O conto
universalmente conhecido de Hans Christian Andersen (aqui)
é paradigmático. De forma aparentemente despretensiosa, para alguns, ele nos
possibilita diversas reflexões sobre poder, honestidade, ignorância, etc. Mas o
que há em comum entre o conto e a lei seca? Respondo: Muita coisa! O conto
demonstra que a autoridade mal administrada gera um reino de medo e ignorância,
afinal o medo de que o rei fosse contrariado ou desagradado, fez com que os
seus funcionários e súditos fingissem ver o que não viam. Em nome da
inteligência e porque não prudência recaíram numa obediência cega.
A lei seca é
como a roupa nova do rei na medida em que os representantes do Estado, reis sem
coroa e realeza, por mero capricho ou incompetência impingem à população uma
lei arbitrária, pois contradiz as experiências evidentes da maioria da população[1] que conhecem pessoas
sensatas que são capazes de beber certa quantidade de bebida alcoólica sem
provocar acidentes. Certamente eles têm a favor a ciência, mas que
ciência, a mesma que tinham os soviéticos ao invadir a Ucrânia, a mesma que
tinham os “médicos” nazistas ou a que têm os que fabricam armas de destruição em
massa?
Pois então
ciência sem razoabilidade não justifica nenhuma ação, pois mais nobre que ela
possa parecer a alguns desavisados, que precisam de uma resposta efetiva para
os males dos acidentes de trânsito, mas que de maneira alguma compactuam com os
princípios autoritários que fundamentam muito do que vem sendo feito
politicamente no Brasil.
O que está
acontecendo no Brasil é que na incapacidade de fazer o que lhes cabem, por
exemplo, punir quem excede os limites e cumprir de fato as leis (que são razoáveis),
os representantes estatais estão optando por um legalismo infrutífero e
invasivo, elaborando medidas que objetivam controlar os cidadãos dizendo o que
é melhor para eles. Ao invés de possibilitar que a cultura se desenvolva
naturalmente, o Estado paizão quer que seus cidadãos sejam eternas crianças,
incapazes de escolherem aquilo que é bom para eles próprios.
Acontece que,
como no caso do conto já citado, é a inocência de uma criança que quebra a
hipocrisia e o fingimento, é a franqueza juvenil que grita: “O rei está nu!”.
Se não cabe às crianças gritarem perante os desmandos estatais, cabe a nós
adultos imitarmos suas virtudes e dizermos com franqueza que o Estado está nu e
quer que nós vejamos crimes inexistentes e fechemos os olhos frentes às suas
arbitrariedades. A aplicação da lei seca não é um fato isolado, mas demonstra
que os “reis e gurus” de nossa pátria não têm pudor de transformar ideias
nobres em medidas totalitárias mascaradas, cheias de bom mocismo.
Continua.
Próximo: Lei seca e a roupa do rei: servilismo dos eclesiásticos?
[1] O argumento neste ponto não é quantitativo do tipo: a
maioria quer, então que seja. A ideia é demonstrar que os fatos podem ser
comprovados por uma simples observação, o que qualquer um no pleno uso de sua
razão pode fazer.
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